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hoje esteve muito calor. muito mais do que é normal. no fim do dia – quando estava mais fresco – reguei o jardim. reguei-o com carinho e consciência de que aquele era um acto de respeito e comunhão com a natureza. apanhei as ervas daninhas e deitei-as fora. varri o pátio e conversei com o vaso da malva que me parecia desanimada.
e senti que o mundo era bom.
e senti que o mundo era bom.
hoje reguei o jardim e – enquanto imaginava sorrisos de agradecimento da relva, das roseiras, das magnólias e da salsa – enrolei a mangueira. enrolei a mangueira que parecia nunca mais acabar e que deve ser enrolada direitinha para depois ser pendurada. enrolei a mangueira, comprida e pesada, com os braços no ar deixando escorrer a água que ainda lá corria dentro. pendurei-a no lugar certo na parede ao fundo da garagem.
e senti que o mundo era bom.
hoje vim para dentro bem disposta, invadida de um sentimento de missão e entrega. visitei a despensa e o frigorífico, amontoei na banca ingredientes ao calha, vesti o avental e comecei a fazer o jantar. passado pouco tempo a cozinha começou cheirar bem e os rapazes estavam por perto e com fome.
e senti que o mundo era bom.
hoje andava por casa como uma rainha num castelo. cantarolava entre um tempero no tacho e uma arrumadela nos brinquedos. estendi a toalha na mesa, espalhei pratos, copos, talheres e guardanapos. chamei os rapazes e jantámos.
e senti que o mundo era bom.
hoje, ao sair da cozinha, tropecei numa coisa. sem saber bem porquê passou-me pelos olhos uma imagem do monte everest em várias modalidades de cores e texturas. hoje, ao sair da cozinha, tropecei numa cesta de roupa para passar a ferro. fiquei ali parada por uns momentos. fiquei sem saber o que fazer.
e senti que o mundo era uma trampa.
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raquel patriarca
onze.agosto.doismilenove
gosta-se deste texto, apesar de todos os apesares.
ResponderEliminarbeijo grande, até já.