Dizem que o Porto —
mais do que uma cidade —
é um sentimento.
Talvez.
Talvez seja muitos sentimentos,
sentidos de maneiras diferentes
por pessoas diferentes.
O Porto é as pessoas
e as conversas que têm e as roupas
que estendem nos estendais das varandas de
ferro
voltadas para a rua.
É as ruas onde moram
as casas com varandas,
é as casas e as varandas.
É o rio, dourado e espesso, e a faina fluvial
que sempre se fará
com vagar, a preto e branco e cinza.
É as árvores que dão flor no inverno —
sem ligar às regras e às estações —
e escrevem com muitas cores no granito das
casas.
O Porto faz-se de feiras de moedas
e de pássaros pequeninos,
faz-se de jogos nos jardins,
jogados por gente de cabelos brancos.
Faz-se de calçadas estreitas
e de prédios antigos, com telhados
muito juntos e janelas que
viram as casas para dentro umas das outras.
Faz-se de verões quentes que trazem
as cascatas e a alegria dos martelos de São
João,
de outonos da cor do fogo, solarengos e muito
frios,
e de invernos chuvosos que fazem humedecer
os livros e as cartas e as pessoas que moram
nas casas.
O Porto faz-se de ruas com lojas de ferragens
e ruas
com lojas de solas e cabedais. Faz-se de
confeitarias antigas com mesas de madeira e
cheiro a pão acabado de fazer,
de livrarias que são espaços encantados
imensos nos cheiros e nos lugares sem tempo e
sem fim.
Faz-se de ruas com galerias e das galerias
que são
nomes de ruas, onde as pessoas vêm e se
encontram
e brindam e dizem poemas.
Faz-se de mercados com bancas de fruta e
hortaliça
e de vendedoras que tratam todas as mulheres
por meninas,
mesmo as mais velhinhas.
Faz-se de morros e bairros e ilhas
com vida própria. De chuvas,
de nevoeiros e de neblinas
que sobem do rio pela manhã.
Faz-se de praias
pequeninas onde a areia é de pedra, e de
fortes e faróis que vigiam o rio e o mar.
O Porto é uma cidade com alma de aldeia,
ao mesmo tempo calma e desassossegada,
com vontade própria, como as flores de
inverno e
as pessoas que atravessam o Douro de barco,
apesar das pontes.
O Porto também é as pontes e as pessoas
que as construíram e as cruzaram
e as cruzam ainda.
O Porto faz-se — sobretudo — das pessoas,
das vidas que correm e das memórias que
criam.
Faz-se das histórias que se vivem e se
lembram,
que se guardam e se contam.
Algumas histórias antigas e outras que se
constroem
a cada dia. Que são nossas e que são
de toda a gente.
O Porto faz-se de histórias
que falam de outro tempo,
mas que carregam a mesma cidade.
Carregam o mesmo sentimento.
raquel patriarca | in: Era uma vez o Porto. Porto: Verso da História, 2014. pp. 9-11.
:) adoro!
ResponderEliminarbeijos,
Joana Miguel