quarta-feira, 19 de maio de 2021

A Lenda da Matéria #6

 
CAPÍTULO 6
UMA SÓ FAMÍLIA
 
Era mesmo possível! Mais, era mesmo verdade!
Os ocultianos, os Mestres da Matéria, aqueles seres maravilhosos que pareciam acabados de sair das páginas de um livro de aventuras eram, afinal, naturais do planeta Terra.
– Mas então… – o Filipe tentava dar palavras à confusão instalada nas nossas cabeças. – Então vocês vieram do mesmo planeta que nós?
– Os nossos antepassados vieram do vosso planeta, sim. – Começou a Arya a contar, enquanto fazia um gesto e nos convida para sentar numa espécie de roda.
– Há muitas, muitas voltas ao Sol, os antigos Mestres deixaram de atender ao carinho que deviam guardar à Natureza. A capacidade de fusão com a matéria é um poder que pode alcançar feitos maravilhosos. A montanha onde se ergue este templo, por exemplo, foi trazida à superfície a partir do fogo incandescente das entranhas do planeta. E o templo em si, foi construído, pedra por pedra, com partículas de todas as substâncias encontradas em todas as partes deste mundo. Foi um esforço de todos, conseguido apenas pela harmonia que reinava entre os elementos da nossa primeira comunidade. Mas em tudo, como na própria Natureza, vive uma fracção de luz e outra de sombra e, assim, a capacidade de fusão com a matéria é um poder que, usado sem cuidado pela Natureza, pode provocar efeitos assustadores e terríveis. Foi o que aconteceu. À beira de um cataclismo que acreditaram ser global, os Antigos deixaram a Terra e vieram refugiar-se no mundo que ficava Oculto atrás da luz do Sol.
A Arya suspirou e sou capaz de jurar que, no preciso momento em que expirou o ar dos pulmões, o seu corpo brilhou e perdeu um pouco as formas, como se fosse esfumar-se e desaparecer, mas, logo a seguir, ali estava ela, a mesma Arya de um momento antes.
Parecia que o silêncio se tinha vindo sentar connosco. Olhávamos para as gravuras na parede e eu não conseguia deixar de pensar na relação entre a luz e a sombra, o nosso Planeta Terra e aquele outro, o Oculto, que girava no espaço à sombra da luz do Sol.
– Nunca pensaram em voltar? – A Joana era sempre assim. Nas nossas conversas e mesmo nas aulas, fazia sempre as melhores perguntas. Mal acabávamos de as ouvir, descobríamos que também nós estávamos mortos por saber as respostas.
– Sim, houve uma altura em que três estudiosos foram enviados ao Planeta Terra para registar os estragos do cataclismo. Foi então que soubemos que a catástrofe não tinha destruído todo o Planeta, apenas o nosso Continente da Atlântida. Tinham até sobrevivido algumas ilhas da Macaronésia. Talvez vocês as conheçam.
Trocámos olhares entre nós e sorrimos.
– Conhecemo-las muito bem, – disse o Filipe.
– Mas nessa altura já não era possível regressarmos. – O Box falava com alguma tristeza e eu temi que se transformasse outra vez em poça de água.
– Quando os Antigos fizeram a primeira viagem, – explicou a Arya – passaram muito perto do Sol, e a capacidade de partilhar a substância com a Natureza aumentou de alguma forma. Já não éramos humanos como antes, não saberíamos integrar-nos, seríamos recebidos como estranhos.
– Mas vocês não são estranhos, – disse a Teresa que tentava oferecer consolo ao Box. – Nós somos todos da mesma família.
– Isso é verdade, – continuou a Arya – mas é uma verdade maior do que parece, e é aí que bate o coração de tudo…. Somos todos uma só família. Vocês, nós, a luz, a sombra, todas as partículas da matéria, toda a Natureza. E, como em qualquer família, devemos estar ligados pela ternura e pelo cuidado.
– Nós também passámos perto do sol, – disse a Teresa – achas que aumentou em nós o poder de controlar a matéria.
– É possível.
– Bem! Imagina! – os olhos do Filipe não podiam abrir-se mais enquanto ele falava. – Se pudéssemos aprender, ou lembrar, a ser Mestres da Matéria! Já não precisávamos de carros, nem de comboios, nem de aviões para viajar e acabava-se tanta poluição!
– E éramos capazes de produzir bons alimentos que pudessem acabar com a fome no mundo, – disse a Joana. – Só não sei se haveria gomas… desculpa lá, Teresa.
– Por falar nisso, – o Box pôs-se de pé tão depressa que parecia que ia levantar voo. – Estou cheio de fome! Primeiro vamos comer e, depois, se vocês quiserem, podemos levar-vos ao Professor.

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