terça-feira, 27 de setembro de 2011

photo grafia LVII

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"sossegada e colectivamente"
praia do poço da cruz - mira
vinteequatro.setembro.doismileonze
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"só depois, já tarde"
drave - serra da freita
catorze.fevereiro.doismilenove
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"sem vidro, reflexo ou rosto"
s. domingos - manteigas - serra da estrela
vinteecinco.maio.doismileoito
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raquel patriarca
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gosto de passear nos sítios fora da época

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gosto de passear nos sítios fora da época
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praias desertas de pescadores rugosos e redes rompidas
gaivotas alinhadas em espera,
sossegada e colectivamente,
pela promessa de uma tempestade
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caminhos de monte com gado nenhum só a sombra de
quem passou de madrugada pela
morrinha das horas e que há-de voltar
só depois, já tarde, longe do toque dos sinos
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calçadas vazias de gente sem eco de passos corridos
janelas sem vidro, reflexo ou rosto
beirais sem amparo que se empreste,
fora de época, a pessoa alguma
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raquel patriarca | vinteequatro.setembro.doismileonze
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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

tento não pensar muito nas coisas

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tento não pensar muito nas coisas
que quero fazer porque - as mais das vezes - se penso, penso demais e não as faço. e, se não as faço, fica-me uma sensação de perda por nunca as ter feito. como uma constante inconclusão de mim própria. outras vezes faço-as, sem pensar, mas na verdade não as devia fazer. e depois de já as ter decidido e começado, não consigo voltar atrás. numa espécie de mudança de ideias que não muda nada. como se cada decisão implicasse a recompensa ou o castigo de a ver realizada. feita. cumprida. e agora que penso nisso,
pergunto-me o que estou a fazer - e porquê - que não tenho ideia de o ter decidido
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raquel patriarca | vinteedois.setembro.doismileonze
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segunda-feira, 19 de setembro de 2011

photo grafia LVI

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"sentar a vontade"
dunas de erk chebbi - sahara - marrocos

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raquel patriarca | dezaseis.julho.doismileonze

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

photo grafia LV

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"uma família de imilchil"
fotografia de raquel patriarca de uma tela de david minguillon
riad aguaviva - medina de marrakech - marrocos
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doze.julho.doismileonze
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sexta-feira, 9 de setembro de 2011

o homem de Imilchil

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Conheci um homem em Imilchil
que não era pastor, nem padeiro nem tecelão.
E isso, por si só, dizia tudo
como se a diferença fosse o seu
traço mais definidor.
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Conheci um homem em Imilchil
que tinha uma Petri 7S de 63.
Não sabia explicar de onde
viera o objecto que lhe definia
os dias, apenas que lho tinha deixado
o pai junto com a vocação
de ser fotógrafo da aldeia.
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Vivia numa casa apertadinha que
ofereceu sem reservas ou cerimónias.
Nas paredes de terracota e
no meio dos livros e jornais
espalhavam-se as imagens de
dezenas de vidas.
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Vi um soldado em despedida, fardado,
orgulhoso e resoluto,
assustado;
uma noiva sorridente e ansiosa, sentada
com as mãos no regaço,
envergonhada;
uma tenda erguida na montanha e um
homem apoiado no cordame o rosto como
um nó;
uma família composta em pose, as
mulheres à esquerda e os homens à direita,
as crianças na frente. No fundo, em pé,
a avó.
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O cheiro dos papéis amarelecidos
misturava-se com o dos líquidos
desconhecidos e emulsões estranhas
com que as vidas se tornavam
imagem latente. O cheiro da missão
única, respeitável, grata
de guardar tantas memórias de tantas
vidas em imagens e cristais de prata.
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Perguntei-lhe se o podia fotografar.
Assentiu, alegre e generoso.
Sentou-se sobre os calcanhares
no chão a máquina pousada na coxa,
a boca séria os olhos a sorrir.
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Conheci um homem em Imilchil
capaz de reconhecer a angústia que
se esconde num sorriso, a saudade
no mais pequeno gesto, a alegria
secreta num olhar.
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Escondia um sonho secreto só dele:
ver uma fotografia do mar.
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raquel patriarca | nove.setembro.doismileonze
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