no verão do ano em que fiz dez anos, aprendi algumas das lições mais importantes da minha existência. aprendi a amizade. aprendi a ser cúmplice na asneira e leal no castigo, completa na confissão e inviolável no segredo. aprendi o conforto do sorriso e a indignidade da agressão, a fragilidade de cada um e a força do grupo, a alegria da brincadeira e a satisfação do trabalho. aprendi a virtude da ternura, a tristeza da solidão e a intimidade do silêncio.
no verão do ano em que fiz dez anos passei um mês na serra em casa da avó e fui, todos os dias e muitas noites, juntar-me ao grupo de desamparados do orfanato local onde crianças como eu, da minha idade, pouco mais velhas ou pouco mais novas, me aceitaram como igual. comemos na mesma mesa, dormimos na mesma camarata, voámos nos mesmos baloiços, calcorreámos os mesmos caminhos, cumprimos as mesmas tarefas, saltmos os mesmos penedos, subimos as mesmas árvores, rezámos as mesmas orações.
nunca mais voltei a encontrar nenhuma das crianças com quem passei aquele verão. gostava de lhes dizer que foram os amigos mais maravilhosos que se pode desejar. que vivem ainda intactos e perfeitos na minha memória. que me ensinaram as lições de vida mais valiosas e que foi um privilégio tê-los conhecido a todos.
setembro de 2008
b. b. booker